O Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou documento, ontem, em que reduz as estimativas de endividamento mundial e do Brasil. Conforme os dados do Monitor Fiscal, a dívida pública bruta brasileira não deverá romper a barreira dos 100% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023, como previsto pela instituição em abril. O estudo, de 114 páginas, estima que a dívida pública bruta brasileira cairá de 98,9% do PIB, em 2020, para 90,6% em 2021, e para 90,2% em 2022. As projeções anteriores eram de 98,4%, neste ano, e de 98,8%, no ano que vem. Para 2023, o fundo estima, agora, que a dívida brasileira será de 91,7% do PIB.
O FMI utiliza uma metodologia diferente da empregada pelo governo brasileiro, porque considera os títulos do Tesouro que estão na carteira do Banco Central. Por isso, o dado de 2020 é diferente dos 88,8% do PIB divulgados pelo BC.
De acordo com o documento do FMI, a agenda prioritária global deve ser o combate à pandemia. Mas o órgão alerta para a necessidade de políticas comprometidas com a austeridade fiscal e critica subsídios, principalmente, para combustíveis fósseis, como a gasolina. O estudo, inclusive, destaca que os países desenvolvidos, que possuem regras fiscais mais claras, estão conseguindo se recuperar mais rapidamente do que os demais.
Apesar da melhora nas projeções do FMI, a dívida pública bruta do Brasil está bem acima da média dos países emergentes, que está em 64,3% do PIB neste ano. Essa taxa é 10 pontos percentuais superior à média de 2019, devido às medidas de aumento de gastos adotadas durante a pandemia, e deverá continuar crescendo nos próximos anos, até chegar em 69,8% em 2026.
Analistas lembram que, além de elevada, a dívida do Brasil deverá ficar mais cara daqui para frente, já que o Banco Central continuará aumentando os juros para controlar a inflação, que voltou para o patamar de dois dígitos, corroendo o poder de compra do brasileiro. Algumas apostas do mercado apontam para uma taxa básica de juros de 10% ao ano até abril de 2022.
“Essa melhora (no endividamento) será apenas do ponto de partida, mas a tendência de alta da dívida voltará nos próximos meses. Basta ver que o gasto com juros já subiu quase 36% em agosto ante o mesmo mês do ano anterior”, alertou Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado Federal.
Vale lembrar também que, devido à inflação mais alta, o deflator do PIB nominal, utilizado no cálculo da taxa da dívida é maior. Isso ajuda contabilmente na redução do endividamento do país e, para piorar, esconde os problemas fiscais, que não desapareceram. “O risco fiscal sempre existiu e é um problema antigo que nenhum governo consegue resolver, porque é preciso se debruçar sobre a questão e fazer reformas para reduzir os gastos não prioritários”, destacou a economista e professora do Insper Juliana Inhasz.
Ela lembrou que a polêmica do veto do presidente Jair Bolsonaro à distribuição de absorventes para estudantes pobres mostrou a incoerência do governo que, recentemente, concedeu teto duplex para os militares aposentados que integram o Executivo, com reajustes de quase 70%. “Não estamos julgando o valor, mas sim o princípio, porque um grupo tem prioridade e outros, não. E isso é uma distorção”, lamentou.
Felipe Salto, em artigo recente, frisou que “o argumento na hora do veto estava errado”, e não poupou críticas à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios, a PEC 32/2021, que institui o calote das dívidas judiciais da União, burlando o teto de gastos. “Vale dizer, o custo da medida (a compra dos absorventes) é estimado em R$ 119,1 milhões. Já a manobra constitucional dos precatórios abrirá folga de R$ 48,6 bilhões no teto de gastos em 2022. Um ataque à Constituição e ao teto, com direito a calote em despesa obrigatória. E a lei? Ora, deixem-nas para os inimigos…”, escreveu Salto.