Equipe de Lula admite plano B à PEC da Transição após crítica de aliados

Foto: Wilton Junior/Estadão / Estadão/

A equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva avalia aceitar uma sugestão do Tribunal de Contas da União (TCU) e abrir um crédito extraordinário – fora do teto de gastos – para bancar o Auxílio Brasil de R$ 600 a partir de janeiro e outras despesas de interesse do novo governo. O chamado “waiver” (licença para gastar) tem batido nos R$ 160 bilhões, podendo chegar a R$ 200 bilhões, como defendem alguns integrantes da cúpula petista.

A medida é uma alternativa à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição e seria adotada por Lula após a posse. A PEC foi anunciada na quinta-feira, 5, como solução para dar a Lula uma licença para gastar fora do teto de gastos e bancar programas prioritários fora do Lula após assumir a Presidência. A proposta, porém, foi alvo de críticas por forçar o futuro governo a ter que aceitar as condições do Centrão para a aprovação.

Até então afastando essa possibilidade, o senador eleito Wellington Dias (PT-PI), escalado por Lula para negociar a votação do Orçamento de 2023 com o Congresso, admitiu nesta sexta-feira, 4, que o governo de transição estuda a possibilidade de abrir um crédito extraordinário como alternativa. A PEC, porém, ainda é prioridade para o petista. O assunto foi discutido pela cúpula do PT em uma reunião na liderança do partido no Senado.

“A PEC é muito segura. O crédito extraordinário é uma alternativa, também já experimentada”, disse Dias após reunião na bancada do PT. “A PEC é o eixo que estamos trabalhando, mas também estamos estudando essa outra alternativa apresentada pelo Tribunal de Contas da União”, ressaltou.

Uma PEC exige a aprovação do Congresso com o voto favorável de no mínimo 308 deputados e 49 senadores, ou seja, o futuro governo já teria que negociar com os parlamentares que estão no mandato atualmente. O PT quer usar a proposta para articular a base do futuro governo. O Centrão sinalizou que apoia a medida, mas exigirá condições como a manutenção do orçamento secreto e o apoio ao projeto de reeleição do presidente, Arthur Lira (PP-AL), no comando da Casa.

Diferente da PEC, a abertura de um crédito extraordinário pode ser feita com uma “canetada” do presidente da República por meio de uma medida provisória. Esse tipo de proposta entra em vigor assim que é assinada, liberando o governo para gastar fora do teto de gastos, e só é derrubada se for rejeitada pelo Congresso ou não for aprovada em 180 dias. A Constituição, no entanto, exige que esse recurso banque apenas medidas “urgentes e imprevisíveis”.

A reviravolta ocorre após crítica de aliados. O crédito extraordinário é defendido por quem vê a PEC como uma armadilha perigosa para o Centrão cobrar uma fatura maior em troca da aprovação. O senador Renan Calheiros (MDB-AL) afirmou que a equipe de Lula fez uma “barbeiragem” ao negociar a proposta com o Centrão. “Não precisa recorrer ao Centrão agora. Não precisa, não é essa a circunstância política do País”, afirmou.

A equipe de transição vê entraves técnicos para a abertura do crédito extraordinário. A PEC Kamikaze, aprovada no ano passado, limitou o valor e as despesas que podem ser gastas em função do estado de emergência, reconhecido em função do aumento do preço de combustíveis. A proposta aumentou gastos na véspera da eleição a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL). Agora, o futuro governo avalia se é necessário prorrogar a situação de emergência para abrir um espaço maior. “Você tem uma situação de emergência e prorroga ou não prorroga a emergência? Nós temos uma situação crítica”, disse Wellington Dias.

Gleisi fala em ver ‘todas as possibilidades’

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que a equipe de Lula tem que “ver todas as possibilidades” para “viabilizar aquilo que foi contratado nas urnas”. “Temos que ver todas as possibilidades que nós temos para viabilizar aquilo que foi contratado nas urnas, que é importante”, disse. “Não podemos entrar em 2023 sem o auxílio emergencial, sem o aumento real do salário mínimo. São coisas que foram contratadas com o povo brasileiro. Tenho certeza que o Congresso tem essa possibilidade, que o Tribunal de Contas também.”

Gleisi, o ex-ministro de governos do PT Aloízio Mercadante, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), o senador Paulo Rocha (PT-PA) e aliados visitaram o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília, onde será montado o gabinete de transição. Na saída, a presidente do partido relatou ter conversado com Renan Calheiros ontem.

Reginaldo Lopes adotou o mesmo tom de Gleisi. “Você tem dois caminhos. Quem tem dois caminhos tem mais caminhos do que ter apenas um caminho. Nós trabalhamos com as duas possibilidades”, disse.

Sob reserva, a reação de Renan Calheiros às tratativas da PEC da Transição com os presidentes do Senado e da Câmara foi vista por petistas como ciúmes. Um parlamentar que integra a comitiva do PT ironizou a postura do emedebista e disse que “ciúmes de homem é pior do que de mulher”. O petista, contudo, contemporizou dizendo que Renan é um aliado importante do PT no Senado por enfrentar a bancada do MDB em momentos delicados para dar apoio ao governo Lula, como foi feito em gestões passadas.

Transição

A equipe de Lula vai ocupar uma área de cerca de 3 mil metros quadrados no CCBB. No local, trabalham funcionários do banco, que passarão para o regime de home office, enquanto durar a transição de governo. Gleisi afirmou que uma equipe de apoio deve começar a trabalhar no local a partir de segunda-feira, 7.

Um dos fundadores do PSDB e aliado de Alckmin, o ex-deputado Floriano Pesaro (SP) estava junto com Gleisi e Mercadante na visita ao CCBB. Pesaro também fará parte da equipe de transição. O paulista saiu do PSDB junto com Alckmin e se também filiou ao PSB. Ele será da cota pessoal do vice-presidente eleito na equipe de transição.

Lula irá participar da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), que acontece no Egito, a partir da segunda quinzena de novembro, segundo Mercadante. Será o primeiro compromisso internacional do petista depois que ele foi eleito presidente.

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