O presidente Jair Bolsonaro vai enfrentar resistências internas de uma ala lulista no Partido Liberal (PL). Apesar de o presidente da legenda, Valdemar Costa Neto, ter garantido “alinhamento” depois de Bolsonaro exigir uma intervenção nos acordos eleitorais nos Estados, a insatisfação persiste e deve provocar baixas mais imediatas no partido e defecções em 2022.
A possibilidade de embate entre as correntes entrou no radar tanto de Costa Neto quanto de Bolsonaro, que deve levar consigo uma bancada fiel que causou um racha no PSL. Um dos dissidentes é o deputado Bibo Nunes (PSL-RS): “Lulista no PL comigo não convive. Tem que ter o mínimo de honra e de dignidade e apertar o botão ejetar”, afirmou o deputado gaúcho.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que toca as conversas em nome do presidente, adotou um tom mais ameno e disse duvidar que Costa Neto cobre um expurgo no partido. A janela de migrações partidárias será em março, sem risco de perda do mandato para parlamentares que concorrerão à reeleição.
“É ruim para a pessoa que defende o Lula e quer ficar, é uma contradição. Cada um fica à vontade se quiser sair”, disse ao Estadão Flávio Bolsonaro. “O Valdemar não vai querer pedir o mandato de ninguém, que saia do partido por causa disso.”
Quem conhece as entranhas do PL afirma que há um generalizado desconforto com o ingresso de Bolsonaro, mas que a maior parte dos políticos prefere se manter em silêncio e garantir os dividendos eleitorais de ser governo em busca da reeleição.
Essa postura cautelosa foi escolhida, principalmente, por deputados que não dependem de ajuda de Bolsonaro como puxador de votos para se eleger. O importante para eles será garantir uma fatia dos recursos do fundo eleitoral para custear a campanha – o PL deve ter cerca de R$ 120 milhões.
Não é o caso do deputado Marcelo Ramos (AM), vice-presidente da Câmara. Ex-comunista e crítico do governo, ele está de saída da legenda por causa da filiação de Bolsonaro. Ele defende “moderação” e “tolerância” com quem pensa diferente. Ramos, no entanto, não controla o diretório local do Amazonas. Quem ainda dá as cartas é o ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, que é a favor da saída de quem não apoiar o presidente.
“Sempre deixei claro a minha incompatibilidade de ser do mesmo partido do presidente. Não por nenhuma antipatia pessoal, mas porque considero que ele não é bom para o futuro do País” , afirmou o vice-presidente da Câmara. “Não posso dizer quem vai sair, mas tem problemas que considero intransponíveis no Ceará, no Piauí, em Alagoas, em Pernambuco, no Pará e em Roraima.”
Há outro problema futuro. A divisão dos recursos públicos que financiam as campanhas. A ala bolsonarista pede “bom senso” na distribuição dos recursos, mas os dois lados, novatos e veteranos no PL, ainda não sentaram à mesa para conversar. A tendência é que o partido privilegie candidatos que se mostrem mais competitivos.
Dois focos de “lulismo” não-resolvidos entraram no radar de Bolsonaro. Os diretórios do PL no Piauí e em Pernambuco. O deputado capitão Fábio Abreu (PI) foi contra a filiação de Bolsonaro e ameaça sair. Em Pernambuco, uma frente de oposição local formada pelo PL, PSDB, Cidadania e PSC pode ruir.
Nos dois casos, dirigentes locais já se manifestaram contra a aliança e tinham outros planos de se coligar a partidos de esquerda. No Ceará, o diretório local também pretendia seguir na aliança do governador Camilo Santana (PT). Na Bahia, embora fosse base do governo Rui Costa (PT), o partido já caminhava para apoiar a pré-candidatura de ACM Neto (DEM), mas agora pode fechar com o ministro da Cidadania, João Roma, segundo ele próprio indicou ao Estadão, ao admitir que vem trabalhando para ser governador da Bahia contra o ex-padrinho político.